quinta-feira, 31 de março de 2022

Homília da QUINTA-FEIRA da 4 ° semana da Quaresma

 I. Introdução

  sinais da sua divindade! Mas, se não rezamos, o coração endurece e aí já não entra

 ninguém: nem sequer Deus!

 Quantas testemunhas de Cristo! João Baptista, repetidamente; a Sagrada

 Escritura, ativa e passivamente (em Jesus cumprem-se todas as promessas e

 profecias); o Pai fala d’Ele desde o céu várias vezes (por exemplo, durante o

  Baptismo); milagres de toda a espécie (desde converter água em vinho e acalmar

ventos, até levantar paralíticos e dar vida a mortos...).

 Contudo, a última palavra é do meu coração. II. Comentário

  Hoje, o Evangelho ensina-nos como Jesus enfrenta a seguinte objeção:

 segundo a lei em Dt 19,15, para que um testemunho tivesse valor, era necessário que

 fosse corroborado por duas ou três testemunhas. Jesus alega a seu favor o

 testemunho de São João Batista, o testemunho do Pai —que se manifesta nos milagres

 operados por Ele— e, finalmente, o testemunho das Escrituras.

 Jesus Cristo repreende os que O escutam, denunciando três impedimentos ao

 Seu reconhecimento como o Messias Filho de Deus: a falta de amor a Deus; a ausência

 de reta intenção —buscam só a gloria humana— e a interpretação interesseira das

 Escrituras.

 O Santo Padre João Paulo II escreveu-nos: «À contemplação do rosto de Cristo,

 só se pode chegar escutando no Espírito a voz do Pai, ninguém conhece o Filho, senão

 o Pai, e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar.

 (cf. Mt 11,27). Assim, portanto, é necessária a revelação do Altíssimo. Mas, para acolhê-

 la, é indispensável colocar-se em atitude de escuta».

 Portanto há que ter em conta que, para confessar Jesus Cristo como verdadeiro

 Filho de Deus, não bastam as provas externas que nos sejam propostas; é muito

 importante a retidão da vontade, ou seja, as boas disposições.

 Neste tempo de Quaresma, intensificando as obras de penitência que facilitam

 a renovação interior, melhoremos as nossas disposições para contemplar o

 verdadeiro rosto de Cristo. Por isso, São Josemaria diz-nos: «Esse Cristo, que tu vês,

 não é Jesus. —Será, contudo, a triste imagem que os teus olhos turvos podem

 formar...—Purifica-te.

 III.

Hoje, o Senhor diz-nos que não temos “desculpa”: há tantas testemunhas e

 Torna claro o teu olhar, com a humildade e com a penitência. Então... não te

 faltarão as luzes limpas do Amor. E terás uma visão perfeita. A tua imagem será então,

 realmente, a Sua: Ele!».

 Atualização

  Hoje, na autodefesa de Jesus ante os judeus, aparece uma das singularidades

do quarto Evangelho: João baseia-se totalmente no Antigo Testamento.

 “[Moisés], pois foi a meu respeito que ele escreveu” (Jo 5,46), disse Jesus aos

 seus adversários; Filipe disse a Natanael: “Encontramos Jesus, o filho de José,

 

de Nazaré, aquele sobre quem escreveram Moisés, na Lei, bem como os

 Profetas” (Jo 1,45).

  A relação entre Jesus e Moisés aparece de um modo pragmático

particularmente ao final do Prólogo: “Pois a Lei foi dada por meio de Moisés,

 a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo” (Jo 1,16-18). A profecia —

 a grande promessa— de Moisés (“Deus suscitará um profeta como eu; a ele o

 escutareis”) cumpriu-se com acréscimos, na maneira desbordante em que

 Deus costuma presentear.

  Quem veiou é mais que Moises, é mais que um profeta. É o Filho, e agora é o

próprio Filho quem será “levantado”. E por isso manifestam-se a graça e a

 verdade, não como destruição, senão como cumprimento da Lei.

 



quarta-feira, 30 de março de 2022

Homília da Quarta-feira da 4° Semana da Quaresma

I. Introdução

A liberdade e a familiaridade com que Jesus se referia a

   Deus, incomodava seus inimigos.

 Era-lhes insuportável ouvir Jesus chamá-lo de Pai e afirmar sua unidade profunda com o ele, e perceber em sua ação indicações de que, realmente, ele possuía algo próprio de Deus. Caso contrário, seu agir seria inexplicável. Os inimigos decidiram, então, eliminar o Mestre por não suportarem sua presença.

 II. Comentário

Jesus não minimizou o problema. Sem titubear, proclamou sua radical dependência do Pai, de quem procedia e sob cuja

   orientação agia.

O Pai outorgou-lhe o direito de comunicar vida e confiou- lhe todo o julgamento. Portanto, todas as pessoas, inclusive os adversários de Jesus, estavam na dependência de seu

 julgamento.

Ele haveria de julgar concedendo vida a quem praticou o

 bem e castigando a quem praticou o mal.


 Os que se opunham ao Mestre, que ficassem atentos. Indispor-se contra ele, significava indispor-se contra o próprio Deus. Opção terrivelmente perigosa!

O alerta de Jesus não surtiu efeito. Antes, só fez aumentar a ira de seus opositores e torná-los cada vez mais determinados

 a levar a cabo o seu intento.

A cegueira tirou-lhes a capacidade de discernir. Por isso, quanto mais Jesus tentava alertá-los para a insanidade de seu projeto, tanto mais insistiam em colocá-lo em prática. O tempo daria razão a Jesus.

 III. Atualização

• A presença de Jesus é incômoda para muitos e por diferentes motivos. No

 Evangelho de hoje, os judeus não aceitavam a liberdade de Jesus, que fazia o que não era permitido aos sábados e chamava a Deus de Pai.

• Jesus vem romper com o esquema estabelecido e, obviamente, haverá questionamento e hostilidade por parte daqueles que têm certeza de que o errado é o outro, nesse caso, Jesus. Em sua resposta aos judeus, Jesus tenta

 clarificar quem ele é e qual é a sua missão.

• Jesus e o Pai formam uma unidade que pode ser traduzida e entendida como perfeita sintonia. Não há aqui relação de dependência e anulação de um ou de

 outro; mas profunda cumplicidade e complementariedade.


 • Jesus não vive por si, mas segundo o projeto que o Pai tem para ele. O que move o nosso coração e firma nossos pés na caminhada




terça-feira, 29 de março de 2022

Homília da terça-feira do 4° semana da Quaresma


I. Introdução

Hoje, São João nos fala da cena da piscina de Betsaida.
Comentário
   deitados: eram cegos, coxos e paralíticos, esperando que a água se movesse» (Jo 5,3).
 Jesus se deixou cair por ali.
   pensavam em se era sábado. Sua má fé matava o espírito.
 A má baba do pecado gotejava de seus olhos. No há pior surdo que o que
 aquele não quer entender.
 O protagonista do milagre levava trinta e oito anos de invalidez. «Jesus viu
 o homem deitado e ficou sabendo que estava doente havia muito tempo. Então
 lhe perguntou: «Você quer ficar curado?» (Jo 5,6), disse-lhe Jesus. Fazia tempo que
 lutava em vão porque não havia encontrado a Jesus.
 Finalmente, havia encontrado ao Homem. Os cinco pórticos da piscina de
 Betsaida retumbaram quando se ouviu a voz do Mestre: «Jesus disse: ‘Levante-se,
 pegue sua cama e ande’» (Jo 5,8). Foi questão de um instante.
 A voz de Cristo é a voz de Deus. Tudo era novo naquele velho paralítico,
 gastado pelo desânimo. Mais tarde, São João Crisóstomo dirá que na piscina de
 Betsaida se curavam os enfermos do corpo, e no Batismo se restabeleciam os da
 alma; lá, era de quando em quando e para um só enfermo.
 No Batismo é sempre e para todos. Em ambos os casos se manifesta o
 poder de Deus através da água.
 O paralítico impotente na beira da água, não te faz pensar na experiência
 da própria impotência para fazer o bem? Como pretendemos resolver, sozinhos,
 aquilo que tem um alcance sobrenatural? Não vês cada dia, ao teu redor, uma
 constelação de paralíticos que se “movem” muito, mas que são incapazes de
 separar-se de sua falta de liberdade? O pecado paralisa, envelhece, mata.
 III.
Parecia, mais uma sala de espera de um hospital: «Muitos doentes ficavam aí
É curioso! Jesus sempre está no meio dos problemas. Ali onde há algo para
“libertar”, para fazer feliz às pessoas, ali está Ele. Os fariseus, ao contrário, só
 Devemos pôr os olhos em Jesus. É necessário que Ele —sua graça— nos
 submerja nas águas da oração, da confissão, da abertura de espírito. Eu e você
 podemos ser paralíticos eternos, ou portadores e instrumentos de luz.
  Atualização
 Hoje, meditando esta cena, analisamos a origem do quarto Evangelho, cuja
peculiaridade levou a pesquisa crítica moderna a duvidar do seu caráter
 “histórico”, considerando-o uma “reconstrução teológica” tardia (posterior
 aos Apóstolos). Mas, alguns papiros do século II encontrados em Egito,
 demonstraram que se escreveu já no século I...
  Alguns autores (Bultman...) afirmaram que as linhas principais do quarto
Evangelho procederiam do “gnosticismo”. Mas, a “gnose”, historicamente,
 
apareceu como movimento espiritual não antes de finais do século I.
 Finalmente, a pesquisa sobre João confirmou que este Evangelho: 1o baseia-
 se num conhecimento extraordinariamente preciso de lugares e tempos
 (próprio de alguém perfeitamente familiarizado com a Palestina do tempo de
 Jesus); 2o sua argumentação parte do Antigo Testamento e, está
 profundamente enraizada no judaísmo da época.
  O Evangelho de João nos diz, expressamente, que se remonta a uma
testemunha ocular do Crucificado: “Aquele que viu dá testemunho (...) ele sabe
 que fala a verdade, para que vós, também, acrediteis” (Jo 19,35).



 •


segunda-feira, 28 de março de 2022

Homília da segunda-feira da 4° semana da Quaresma

I. Introdução

  fez o homem do Evangelho que tinha o filho doente. ‘Senhor, desça, antes

 que meu filho morra'. ‘Vá, teu filho vive!’.

 Aquele homem acreditou na palavra que Jesus lhe havia dito e partiu.

 A fé é abrir espaço para este amor de Deus, é abrir espaço para o poder, ao

 poder de Deus, mas não ao poder de quem é muito poderoso, ao poder de

 quem me ama, de quem está apaixonado por mim e que quer a alegria

 comigo.

  mude".

 II. Comentário

 Em vez de “milagres”, o evangelista João adota o termo “sinais” para designar os

 feitos extraordinários que Jesus realizou. Ao todo, ao longo de seu Evangelho, João apresenta

 sete sinais; recordemos que o número sete na Bíblia significa plenitude.

 aconteceu.

Inicialmente, Jesus afirma que sem sinais e prodígios o povo não é capaz de acreditar;

 e, ao ser interpelado por um pai aflito, Jesus, de forma simples, diz que a cura esperada já

  O pai da criança constata o que Jesus realizou e, por causa desse sinal, passa a

 acreditar. Os sinais realizados por Jesus têm, sim, caráter extraordinário, mas, sobretudo,

 pedagógico; não tem valor em si o “fora do normal”, mas o que esse sinal pode provocar de

 adesão ao projeto proposto por Jesus.

 III.

• •

Crer. Crer que o Senhor pode me mudar, que Ele é poderoso: como

 Isto é a fé. Isto é crer: é abrir espaço para que o Senhor venha e me

O dia a dia, sim, deve se tornar extraordinário e nos motivar a construir um mundo

 mais justo e fraterno onde a vida de todos transborde.

 Atualização

 Hoje o saber da ciência sozinho não é suficiente. Temos necessidade não só

do pão material, mas precisamos de amor, de significado e de esperança, de

 um fundamento seguro.

  A fé oferece-nos precisamente isto: é um entregar-se confiante a um "Tu", que

é Deus, o qual me confere uma certeza diversa, mas não menos sólida do que

 aquela que me deriva do cálculo exato ou da ciência. A fé não é simples

 assentimento intelectual do homem a verdades particulares sobre Deus; é um

 gesto mediante o qual me confio livremente a um Deus que é Pai e que me

 ama; é adesão a um "Tu" que me dá esperança e confiança.

  Deus revelou que o seu amor pelo homem, por cada um de nós, é

incomensurável: na Cruz, Jesus de Nazaré, o Filho de Deus que se fez homem,

 mostra-nos do modo mais luminoso até que ponto chega este amor, até ao

 dom de si mesmo, até ao sacrifício total.



 

domingo, 27 de março de 2022

Homília do Domingo da IV Semana da Quaresma

 I. Introdução

Hoje já sabemos aonde vai a parar esse “filho pródigo”... Desapareceu a seu pai dilapidando a herança! E quando já não lhe fica nada, ninguém preta atenção...todos desaparecem! É a consequência de “entreter-se” com a liberdade em lugar de “entregar-se”.

 O irmão mais velho: ficou em casa, mas também não ama o pai. Valoriza mais o dinheiro perdido que o irmão encontrado... O bom pai abraça o filho mais novo e eleva a olhada do mais velho: «Tudo que é meu é seu». Assim é Deus!

II. Comentário

 Hoje, domingo Laetare (“Exultai”), quarto da Quaresma, escutamos este fragmento intimo do Evangelho segundo São Lucas, no que Jesus justifica a sua pratica inaudita de perdoar os pecados e recuperar os homens para Deus.

Sempre me perguntei se a maioria das pessoas entendia bem a expressão “o filho pródigo” com a qual se designa esta parábola. Penso que devíamos rebatizá-la com o nome da parábola do “Pai prodigioso”.

Efetivamente, o Pai da parábola — que se comove ao ver que volta aquele filho perdido pelo pecado— é um ícone do Pai do Céu refletido no rosto

de Cristo: «Quando ainda estava longe, seu pai o avistou e foi tomado de compaixão. Correu-lhe ao encontro, abraçou-o e o cobriu de beijos» (Lc 15, 20).

Jesus dá-nos a entender claramente que todo o homem, inclusive o mais pecador, é para Deus uma realidade muito importante que não quer perder de nenhuma maneira; e que Ele está sempre disposto a conceder-nos com gozo inefável o seu perdão (até ao ponto de não poupar a vida de seu Filho).

Este domingo tem um matiz de serena alegria e, por isso, é designado como o domingo “exultai”, palavra presente na antífona de entrada da Missa de hoje: «Alegra-te, Jerusalém; rejubilai, todos os seus amigos. Exultai de alegria». Deus compadeceu-se do homem perdido e extraviado, e manifestou-

  lhe em Jesus Cristo – morto e ressuscitado – a sua misericórdia.

João Paulo II dizia na sua encíclica Dives in misericórdia que o amor de Deus, numa história ferida pelo pecado, converteu-se em misericórdia, compaixão. A Paixão de Jesus é a medida desta misericórdia. Assim entendemos que a alegria maior que damos a Deus é deixar-nos perdoar apresentando à sua misericórdia a nossa miséria, o nosso pecado.


 Às portas da Páscoa acudimos de bom grado ao sacramento da penitência, a sua fonte da divina misericórdia: daremos a Deus uma grande alegria, ficaremos cheios de paz e seremos mais misericordiosos com os outros. Nunca é tarde para nos levantarmos e voltar para o Pai que nos ama!

III. Atualização

 • «O Pai Eterno pôs com inefável benignidade os olhos do seu amor naquela alma e começou a falar-lhe assim: ‘Minha querida filha! Estou firmemente

 decidido a usar de misericórdia para com todo o mundo e atender a todas as necessidades dos homens'» (Santa Catalina de Siena)

• «João Paulo II dizia na sua encíclica “Dives in misericordia” que o amor de Deus, numa história ferida pelo pecado, se tornou misericórdia, compaixão. A Paixão de Jesus é a medida desta misericórdia» (Bento XVI)

• «O símbolo dos céus remete-nos para o mistério da Aliança que nós vivemos, quando rezamos ao Pai. Ele está nos céus: é a sua morada. A casa do Pai é, pois, a nossa “patria”. Foi da terra da Aliança que o pecado nos exilou, e é para o Pai, para o céu, que a conversão do coração nos faz voltar. Ora, foi em Cristo que o céu e a terra se reconciliaram, porque o Filho ‘desceu do céu’, sozinho, e para lá nos faz subir juntamente consigo, pela sua cruz, ressurreição e ascensão» (Catecismo da Igreja Católica, no 2.795



sábado, 26 de março de 2022

Que saudades do fogão a lenha que fica por trás das casas de taipas.

Que saudades da Jara, do pote e da quartinha, lá em num sabe, tinha sempre água friinha, agente não tinha geladeira, mas não fartava um goipe de água fria, era arretado demais sou.

Eita, que saudades do tempo de não fazer nada, só ficar com a cara pra cima... Ali eu pensava em tudo... Tudo que vinha na cabeça, me sentia livre... Sem preconceitos, sem preocupações com o que os outros iam achar, olhar ou falar, num sabe? Coisas que essa sociedade vive perdendo tempo!?!

Ah, tenho saudades também do tempo das boas traquinagens, que as crianças de hoje não sabem fazer, era tão bom... Aperriar a nossa mãe... Quando ouvia ela gritar pelo nosso nome, sabia, que apesar dos afazeres, ela estava com o sentido na gente... Quem ama pensa... Quem ama não perde o sentindo!

Que saudades do tempo que apanhava (pisa), era muito engraçado chorando por causa da dor passageira, mas querendo rir, quando ouvia da minha mãe, agora chore com gosto, eu que era mau criado interrompia o choro e dizia: ora lá, quem já via chorar com gosto? 

Ela dizia: pera aí, ainda e tá esmugando? 

Kkkkkkk Eu não?!! Era bom demais!


O tempo passa!

Mas, que saudades!

Padre Edivânio José 




Homília do Sábado da 3° semana da Quaresma

I. Introdução

II. Comentário

   parecer quase idênticos, já que se encontram no mesmo lugar, realizando a mesma

 atividade: ambos «subiram ao templo para orar» (Lc 18,10).

 Porém, para além das aparências, no mais profundo das suas consciências, os

 dois homens são radicalmente diferentes: um, o fariseu, tem a consciência tranquila,

 enquanto que o outro, o publicano—cobrador de impostos — está inquieto devido a

  sentimentos de culpa.

  Ratzinger (“Consciência e verdade”), afasta a falsa tranquilidade de consciência e

 podemos chamar-lhe “protesto da consciência” contra a minha existência auto-

 satisfeita.

 III.

Hoje, Cristo apresenta-nos dois homens que, a um observador casual, podiam

Hoje em dia tendemos a considerar os sentimentos de culpa – os remorsos —

 como algo próximo de uma aberração psicológica.

 Contudo, o sentimento de culpa permite ao publicano sair reconfortado do

 Templo, uma vez que «este voltou para casa justificado, mas o outro não» (Lc 18,14).

 «O sentimento de culpa», escreveu Bento XVI, quando ainda era Cardeal

É tão necessário para o homem como a dor física, que significa uma alteração

 corporal do funcionamento normal».

 Jesus não nos induz a pensar que o fariseu não esteja a dizer a verdade quando

 afirma que não é ladrão, nem desonesto, nem adúltero e paga o dízimo no Templo

 (cf. Lc 18,11); nem que o cobrador de impostos esteja a delirar ao considerar-se a si

 próprio como um pecador.

 A questão não é essa. O que realmente acontece é que «o fariseu não sabe que

 também tem culpas. Ele tem uma consciência plenamente clara.

 Mas o “silêncio da consciência” fá-lo impenetrável perante Deus e perante os

 homens, enquanto que o “grito de consciência”, que inquieta o publicano, o torna

 capaz da verdade e do amor. Jesus pode remover os pecadores!» (Bento XVI).

  Atualização

 Hoje, Jesus Cristo ilustra graficamente a relação entre “ethos” (personalidade

ou natureza humana) e “graça”. O fariseu se vangloria de suas muitas virtudes;

 o publicano conhece seus pecados, sabe que não pode se vangloriar ante Deus

 e, consciente de sua culpa, pede graça. Isto significa que um representa o

 “ethos” e o outro a graça sem “ethos” ou contra o "ethos"?

  Na realidade trata-se de duas maneiras de se situar ante Deus e ante si

mesmo. Um nem olha a Deus, mas só a si mesmo; o outro se vê em relação

 com Deus e, com isso, abre-se lhe o olhar para si mesmo (sabe que tem

 necessidade de Deus e que tem de viver de sua bondade). Não se nega o

 “ethos” só se lhe libera da estreiteza do moralismo e se lhe coloca no contexto

 da relação de amor com Deus.

 

 A graça que imploro não me isenta do “ethos”: preciso de Deus e, graças a sua

bondade, eu posso me encaminhar à Bondade.


 

sexta-feira, 25 de março de 2022

Homília da da ANUNCIAÇÃO DO SENHOR

 


(branco, glória, creio [com genuflexão às palavras “e se encarnou”], prefácio próprio – ofício da solenidade)

I. Introdução

Ao entrar no mundo, Cristo disse: Eis-me aqui, ó Pai, para fazer a tua vontade

      (Hb 10,5.7).

Conforme a exortação apostólica Marialis Cultus, de São Paulo 6o, a solenidade da Anunciação do Senhor “era e continua a ser festa conjuntamente de Cristo e da Virgem Maria: do Verbo que se torna filho de Maria e da Virgem que se torna Mãe de Deus”.

Celebremos repletos de gratidão a Deus pelo sim de Jesus e pelo sim de Maria.

 II. Comentário

Este dia – 25 de março e nove meses antes do Natal – marca a concepção de

  Maria, dia em que ela disse sim a Deus e se comprometeu a colaborar com seus planos. Maria, em sua vida cotidiana em Nazaré, é visitada pelo anjo do Senhor. O

 primeiro anúncio do anjo é de alegria e otimismo: “alegre-se, [...] o Senhor está com você!” A presença do Senhor alegra e dá esperança a qualquer ser humano. Diante disso, Maria fica se interrogando o que seria essa saudação. O anjo a tranquiliza, o Espírito Santo se encarregará de solucionar as dúvidas.

Ao receber a proposta do plano de Deus, ela aceita o desafio e se deixa envolver pelo Espírito de Deus. Submetendo-se à vontade divina, Maria colabora com a humanidade, trazendo ao mundo aquele que será chamado Filho de Deus, o Emanuel, o Deus-conosco. Com isso, ela concretiza a esperança que Israel há muito tempo

 esperava.

Maria é a humanidade que ama, crê e aceita Deus e se converte em instrumento de sua obra. Todo o relato – a intervenção do anjo, a aceitação de Maria e o Espírito criador – conduz para um único objetivo: a salvação da humanidade.


 É importante abrir-se à ação de Deus, a exemplo de Maria, e buscar realizar, dia a dia, o que ele espera de cada um. Ele aguarda nosso sim para que continue agindo entre nós.

 III. Atualização

Bento XVI disse em uma entrevista; «Ousai decisões definitivas, porque

 na verdade são as únicas que não destroem a liberdade, mas lhe criam

 a justa direção, possibilitando seguir em frente e alcançar algo de grande na vida.

• Sem dúvida, a vida só pode valer se tiverdes a coragem da aventura, a confiança de que o Senhor nunca vos deixará sozinhos.

• Eu digo-vos: Coragem! Tomar o risco—o salto ao decisivo— e com isso aceitar a vida por inteira, isso desejo transmitir». Maria: Eis aqui um exemplo.



quinta-feira, 24 de março de 2022

Homília da quinta-feira 3a SEMANA DA QUARESMA

 I. Introdução

Eu sou a salvação do povo, diz o Senhor: quando, em qualquer aflição, clamarem por mim, eu os ouvirei e serei seu Deus para sempre.

Por meio de seus profetas, Deus nunca deixa de orientar seu povo; este é que muitas vezes se torna surdo à voz do Senhor e se afasta de seus ensinamentos. Evitando ter o coração dividido, acolhamos a vontade divina.

 II . Comentário

As curas promovidas por Jesus, para além do bem-estar recaído sobre os curados, também reintegravam tais pessoas ao convívio social, pois lhes restituíam a dignidade e a plenitude da vida.

Jesus é acusado de realizar suas ações por meio do príncipe dos demônios, e não por meio de Deus; contudo, ele devolve a pergunta e afirma que um reino dividido é facilmente destruído.

Precisamos discernir e escolher com quem estamos e ao lado de quem nos posicionamos. Não é possível estarmos com os pés em duas canoas, obviamente não haverá estabilidade e em pouco tempo estaríamos dentro d’água.

Recolher, por mais difícil que seja, implica renunciar, pois optamos seguir por determinada via assumindo as consequências dessa opção. Quem não se decide vive na superficialidade e de forma inconsistente.

 III Atualização

 •

 Mas este episódio contém uma admoestação que serve a todos nós.

 Com efeito, pode acontecer que uma grande inveja pela bondade e

 pelas boas obras de uma pessoa possa levar a acusá-la falsamente.

 Há nisto um grande veneno mortal: a maldade com que, de maneira

 intencional se pretende destruir a boa fama do outro.

 Deus nos livre desta terrível tentação! E se, examinando a nossa

 consciência, nos apercebemos que esta erva daninha está a germinar

 dentro de nós, vamos imediatamente confessá-lo no sacramento da

 Penitência, antes que se desenvolva e produza os seus efeitos

 malvados, que são incuráveis.

 Estai atentos, pois esta atitude destrói as famílias, as amizades, as

 comunidades e até a sociedade.



   

quarta-feira, 23 de março de 2022

Homília da Quarta-feira da 3° Semana da Quaresma


I. Introdução

II. Comentário

  Hoje em dia há muito respeito pelas distintas religiões. Todas elas expressam

 a busca da transcendência por parte do homem, a busca do além, das realidades

 eternas.

 No entanto, no cristianismo, que afunda suas raízes no judaísmo, esse

 fenômeno é inverso: é Deus quem procura o homem.

  Como lembrou João Paulo II, Deus deseja se aproximar do homem, Deus quer

 dirigir-lhe suas palavras, mostrar-lhe o seu rosto porque procura a intimidade com

 ele. Isto se faz realidade no povo de Israel, povo escolhido por Deus para receber suas

 palavras.

 Essa é a experiência que tem Moisés quando diz: «Pois qual é a grande nação

 que tem deuses tão próximos como o SENHOR nosso Deus, sempre que o

 invocamos?»(Dt 4,7). E, ainda, o salmista canta que Deus «Anuncia a Jacó a sua

 palavra, seus estatutos e suas normas a Israel.

 Não fez assim com nenhum outro povo, aos outros não revelou seus preceitos.

 Aleluia!» (Sal 147,19-20).

 Jesus, pois, com sua presença leva a cumprimento o desejo de Deus de

 aproximar-se do homem. Por isto diz que: «Não penseis que vim abolir a Lei e os

 Profetas.

 Não vim para abolir, mas para cumprir» (Mt 5,17). Vem a enriquecê-los, a

 iluminá-los para que os homens conheçam o verdadeiro rosto de Deus e possam

 entrar na intimidade com Ele.

 Neste sentido, menosprezar as indicações de Deus, por insignificantes que

 sejam, comporta um conhecimento raquítico de Deus e, por isso, um será tido por

 pequeno no Reino dos Ceús.

 empanados».

E é que, como dizia São Teófilo de Antioquia, «Deus é visto pelos que podem

 ver-lhe, só precisam ter abertos os olhos do espírito (...), mas alguns homens os têm

  Aspiremos, pois, na oração seguir com grande fidelidade todas as indicações

 do Senhor. Assim, chegaremos a uma grande intimidade com Ele e, portanto, seremos

 tidos por grandes no Reino dos Céus.

 III. Atualização

 • «A fim de preparar o homem para uma vida de amizade com Deus, o Senhor deu as palavras do Decálogo: por isso, estas palavras também continuam a valer para nós, e a vinda em carne de Nosso Senhor não

  as revogou, pelo contrário deu plenitude e universalidade» (Santo Irineu)


 • «Todos os mandamentos revelam todo o seu sentido como exigência do amor e todos se unem no grande mandamento: amar a Deus de todo o coração e ao próximo como a si mesmo» (Francisco)

• «A Lei evangélica dá cumprimento aos mandamentos da Lei. O sermão do Senhor, longe de abolir ou desvalorizar as prescrições morais da Lei antiga, tira deles as virtualidades ocultas, fazendo surgir novas

 exigências: revela toda a verdade divina e humana (...)» (Catecismo da Igreja Católica, no 1.968



 

terça-feira, 22 de março de 2022

Homília da Terça-feira da 3° Semana da Quaresma

I. Introdução

II. Comentário

  Hoje, o Evangelho de Mateus convida-nos a uma reflexão sobre o mistério do perdão,

 propondo um paralelismo entre o estilo de Deus e o nosso na hora de perdoar.

  O homem atreve-se a medir e a levar em conta a sua magnanimidade

 perdoadora: «Senhor, quantas vezes devo perdoar, se meu irmão pecar contra mim?

  Até sete vezes?» (Mt 18,21).

A Pedro parece-lhe que sete vezes já é muito e que é, talvez, o máximo que

 podemos suportar. Bem visto, Pedro continua esplêndido, se o compararmos com o

 homem da parábola que, quando encontrou um companheiro seu que lhe devia cem

 denários, «Ele o agarrou e começou a sufocá-lo, dizendo: ‘Paga o que me deves’» (Mt

 18,28), negando-se a escutar a sua súplica e a promessa de pagamento.

 Fechadas as contas, o homem, ou se nega a perdoar, ou mede estritamente a

 medida do seu perdão. Verdadeiramente ninguém diria que receberíamos da parte

 de Deus um perdão infinitamente reiterado e sem limites. A parábola diz: «o senhor

 teve compaixão, soltou o servo e perdoou-lhe a dívida» (Mt 18,27). E a divida era muito

 grande.

 Mas a parábola que comentamos põe acento no estilo de Deus na hora de

 outorgar o perdão. Depois de chamar à ordem o seu devedor em atraso e de o fazer

 ver a gravidade da situação, deixou-se enternecer repentinamente pelo seu pedido

 contrito e humilde: «‘Tem paciência comigo, e eu te pagarei tudo’. Diante disso, o

 senhor teve compaixão...» (Mt 18, 26-27).

 Este episódio põe à vista aquilo que cada um de nós conhece por experiência

 própria e com profundo agradecimento: que Deus perdoa sem limites ao arrependido

 e convertido. O final negativo e triste da parábola, contudo, faz honras de justiça e

 manifesta a veracidade daquela outra sentença de Jesus em Lc 6,38: «Com a medida

 com que medirdes sereis medidos.

  III. Atualização

• «Aquele que perdoa e aquele que é perdoado, encontram-se num ponto essencial, na dignidade» (São João Paulo II)

  • «O perdão é o instrumento, posto nas nossas frágeis mãos, para alcançarmos a serenidade de coração» (Francisco)

• «Não há nenhuma falta, por mais grave que seja, que a santa Igreja não possa perdoar. «Nem há pessoa, por muito má e culpável que seja, a quem não deva ser proposta a esperança certa do perdão, desde que se

 arrependa verdadeiramente dos seus erros». Cristo, que morreu por todos os homens, quer que na sua Igreja as portas do perdão estejam


sempre abertas a todo aquele que se afastar do pecado (cf. Mt 18,21-22)» (Catecismo da Igreja Católica, no 982)



 

segunda-feira, 21 de março de 2022

Homília da III semana da Quaresma.

 I. Introdução

  Não é fácil compreender o que seja a humildade. Esta resulta duma

 mudança que o próprio Espírito realiza em nós através da história que

 vivemos, como acontece, por exemplo, ao sírio Naaman (cf. 2 Re 5).

 Gozava de grande fama, no tempo do profeta Eliseu. Era um general

 valoroso do exército arameu, que demonstrara o seu valor e coragem em

 várias ocasiões. Mas por trás da fama, da força, da estima, das honras, da

 glória, este homem vive um drama terrível: é leproso.

 A sua armadura, a mesma que lhe proporciona fama, na realidade

 cobre uma humanidade frágil, ferida, doente. Esta contradição, encontramo-

 la frequentemente na nossa vida: às vezes, os grandes dons constituem a

 armadura para encobrir grandes fragilidades.

 II. Comentário

Hoje vemos o cepticismo dos conterrâneos de Jesus quando este lhes disse

 que se cumpria sobre Ele a Escritura: “O Espírito do Senhor está sobre mim...” (Is 61,1).

 Efetivamente a Lei e os Profetas falam do futuro Messias.

 Relacionados com o mistério pascal, destacam Zacarias mencionando um

 reino de “mar a mar” (presságio da universalidade da salvação); um rei de paz (que

 rompe os arcos guerreiros e chega montado num burrico); o pastor ferido que com a

 sua morte, traz a salvação; o trespassado...

 III Atualização

Em Isaías encontramos a visão do servo de Deus que sofre e que servindo

 oferece a vida pela multidão trazendo assim a salvação...

 O que neles é ainda uma visão misteriosa, cuja configuração concreta não se

 pode perceber, desvenda-se pouco a pouco no obrar de Jesus Cristo, até adquirir a

 sua plena forma depois da ressurreição.

 O próprio Jesus transforma-se mais tarde, depois da Páscoa, na chave para ler

 de uma forma nova a Lei e os Profetas.

  -- A afirmação de Jesus é o preâmbulo da lição que quer dar à gente reunida na

 sinagoga e assim, abrir os seus olhos à evidencia de que pelo simples feito de serem

 membros do “Povo escolhido” não têm nenhuma garantia de salvação, cura,

 purificação (isso o confirmará com os dados da história da salvação).

 -- Mas, dizia que a afirmação de Jesus, para muitas e muitos é, com excessiva

 frequência, motivo de desculpa para não “comprometer-nos evangelicamente” no

 nosso ambiente cotidiano. Sim, é uma daquelas frases que todos aprendemos de

 memória e, que efeito faz!

 -- Parece como gravada na nossa consciência de maneira particular e quando no

 escritório, no trabalho, com a família, no circulo de amigos, no nosso meio social

 

quando devemos de tomar decisões compreensíveis à luz do Evangelho, esta “frase

 mágica” tira-nos para trás como dizendo-nos: —Não vale a pena esforçar-te, nenhum

 profeta é bem recebido na sua terra! Temos a desculpa prefeita, a melhor das

 justificações para não ter que dar testemunho, para não apoiar a aquele companheiro

 que é vitima da gestão da empresa, ou ignorar e não ajudar à reconciliação daquele

 casal conhecido



domingo, 20 de março de 2022

–Homíliado3• DAQUARESMA


(roxo, creio – 3a semana do saltério) I. Introdução

Tenho os olhos sempre fitos no Senhor, porque livra os meus pés da

     armadilha. Olhai para mim, tende piedade, pois vivo sozinho e infeliz (Sl 24,15s).

 Aproximando-nos do Deus da vida nesta santa liturgia, vamos nos abrir ao apelo que ele nos dirige neste tempo quaresmal. Somos convidados a assumir uma caminhada de conversão, apresentando ao Senhor os frutos que ele de nós espera. Jesus, na Eucaristia, é o divino vinhateiro que fecunda nosso coração e o rochedo que sustenta nosso viver.

 II. Comentário

A partir de duas tragédias – as atrocidades provocadas por Pilatos e o acidente da torre de Siloé, matando dezoito pessoas -, Jesus aproveita para nos dar alguma lição.

Não podemos ver as desgraças como castigo divino para os que foram

 atingidos. Podem, porém, ser vistas como apelo de conversão. Todos temos necessidade de mudança de vida para o melhor.

Deus pode nos falar também por meio dos fatos, mesmo não muito agradáveis. As pessoas que ficaram chocadas com as mortes das tragédias recebem de Jesus uma resposta talvez mais chocante ainda: se vocês não se converterem, morrerão do mesmo modo.

O Senhor que diz palavras de ânimo, de consolo, é o mesmo que profere expressões de advertência. Não faz isso, porém, para escandalizar ou para

 deprimir os seguidores. Adverte por amor, misericórdia, compaixão.

O amor de Deus por nós se apresenta às vezes como remédio que cura, mas que, para ser eficiente, pode ser amargo.


 A parábola a seguir parece nos dizer que a conversão que Jesus pede não é apenas algo que demonstramos com bonitas palavras, mas consiste em produzir frutos.

Podemos nos questionar sobre nosso envolvimento diante de tanta violência, mortes, tragédias que diariamente presenciamos ou recebemos pelos meios de comunicação.

III. Atualização

 -Hoje, Jesus é interpelado sobre alguns factos dolorosos. Diante da fácil conclusão de considerar o mal como efeito da punição divina, Jesus restitui a verdadeira imagem de Deus, que é bom e não pode desejar o mal.

--Jesus convida a fazer uma leitura diversa daqueles factos, colocando-os na perspectiva da conversão: as desventuras, os acontecimentos dolorosos, não devem suscitar em nós curiosidade ou busca de presumíveis culpados, mas devem representar ocasiões para reflectir, para vencer a ilusão de poder viver sem Deus, e para fortalecer, com a ajuda do Senhor, o compromisso de mudar de vida.

 —A possibilidade de conversão exige que aprendamos a ler os acontecimentos da vida na perspectiva da fé, isto é, animados pelo santo temor de Deus. Na presença de sofrimentos e lutos, verdadeira sabedoria é deixar-se interpelar pela precariedade da existência e ler a história humana com o olhar de Deus.



 

sábado, 19 de março de 2022

Homília da Solenidade de São José.

 I. Introdução

  Hoje, festa de são José, consideramos teologicamente a realidade do trabalho.

 A “Bíblia" mostra como o trabalho pertence à condição originaria do homem. Quando

 o Criador plasmou o homem a sua imagem e semelhança, o convidou para trabalhar

 a terra... E o mesmo Filho de Deus, fazendo-se semelhante em todo a nós, dedicou

 muitos anos as atividades manuais (era o “filho do carpinteiro”).

 O trabalho é fundamental para o desenvolvimento do homem e da sociedade.

  Deve se organizar “sempre" no pleno respeito da dignidade humana e ao serviço do

bem comum: o homem é sujeito e protagonista do trabalho. Ao mesmo tempo, é

 indispensável que o homem não se deixe dominar pelo trabalho, que não o idolatre,

 pretendendo achar nele o sentido último e definitivo da vida.

 É necessário viver uma espiritualidade que ajude os crentes a se santificar

 através do seu trabalho, imitando a são José, que cada dia abasteceu com suas mãos

 as necessidades da Sagrada Família.

  II. Comentário

Hoje, a igreja nos convida a contemplar a amável figura do santo Patriarca.

 Escolhido por Deus e por Maria, José viveu como todos nós entre tristezas e alegrias.

 Temos que olhar para qualquer uma de suas ações com interesse especial. Sempre

 aprenderemos com ele. É conveniente que nos coloquemos no lugar dele para imitá-

 lo, porque assim poderemos responder, como ele, à vontade divina.

 Tudo em sua vida —modesta, humilde, simples— é luminoso. Por isso, místicos

 famosos (Teresa de Ávila, Hildegarde de Bingen, Teresinha de Lisieux), grandes

 Fundadores (Benito, Bruno, Francisco de Assis, Bernardo de Clairvaux, Josemaría

 Escrivá) e tantos santos de todos os tempos nos encorajam a tratar e ame-o para

 seguir os passos daquele que é o Padroeiro da Igreja. É o atalho para santificar a

 privacidade do nosso lar, entrar no seio da Sagrada Família, para levar uma vida de

 oração e também para santificar o nosso trabalho.

 Graças à sua união constante com Jesus e Maria - essa é a chave! - José pode

 simplesmente experimentar o extraordinário, quando Deus o pede, como na cena

 evangélica da Missa de hoje, pois costuma realizar tarefas ordinárias sobretudo nunca

 são irrelevantes porque garantem uma vida feliz e bem-sucedida, que leva à bem-

 aventurança celestial.

 Todos nós podemos, escreve o Papa Francisco, “encontrar em São José - o

 homem que passa despercebido, o homem da presença quotidiana, discreto e

 escondido - um intercessor, um apoio e um guia nos momentos de dificuldade (...).

 José nos ensina que ter fé em Deus também inclui acreditar que Ele pode agir mesmo

 em meio aos nossos medos, nossas fragilidades, nossas fraquezas. E nos ensina que,

 em meio às tempestades da vida, não devemos ter medo de entregar o leme do nosso

 barco a Deus.

  III. Atualização

Hoje, a Igreja celebra a solenidade de São José, esposo de Maria. É como um

 parêntesis alegre dentro da austeridade da Quaresma. Mas a alegria desta festa não

 

é um obstáculo para continuarmos a avançar no caminho de conversão, próprio do

 tempo   quaresmal.

Bom é aquele que, elevando o seu olhar, faz esforços para que a sua própria vida se

 adapte ao plano de Deus. E bom é aquele que, olhando para os outros, procura

 interpretar sempre no bom sentido todas as ações que realizam e defender o seu bom

 nome. Nestes dois aspectos de bondade se nos apresenta São José no Evangelho de

 hoje.

Deus tem um plano de amor para cada um de nós, já que «Deus é amor» (1Jo 4,8).

 Porém, a dureza da vida leva a que algumas vezes não o saibamos descobrir.

 Logicamente, queixamo-nos e resistimos a aceitar as cruzes.

 Não deve ter sido fácil para São José ver que Maria «antes de passarem a conviver, se

 encontrou grávida pela ação do Espírito Santo» (Mt 1,18). Tinha pensado desfazer o

 acordo matrimonial, mas «secretamente» (Mt 1,19). Contudo, «quando o anjo do

 Senhor lhe apareceu em sonho» (Mt 1,20) revelando-lhe que tinha de ser pai legal do

 Menino, aceitou imediatamente «e acolheu sua esposa» (Mt 1,24).

 A Quaresma é uma boa ocasião para descobrirmos o que é que Deus espera de nós, e

 reforçar o nosso desejo de o pôr em prática. Peçamos ao bom Deus «por intercessão

 do Esposo de Maria», como diremos na Oração Coleta da Missa, que avancemos no

 nosso caminho de conversão, imitando São José na aceitação da vontade de Deus e

 no exercício da caridade com o próximo. E, ao mesmo tempo, tenhamos presente que

 «toda a Santa Igreja está em dívida com a Virgem Mãe, já que por ela recebeu Cristo,

 assim também, depois dela, São José é o mais digno do nosso agradecimento e

 reverência (S. Bernardino de Sena).



quinta-feira, 17 de março de 2022

Homília da Sexta-feira da II semana da Quaresma

 I. Introdução

A essência da parábola é contar algo considerado verdadeiro, mas de maneira simples, sutil e elegante.

Jesus sabe utilizar muito bem esse recurso que tem como alvo, hoje, os chefes dos sacerdotes e anciãos.

II. Comentário

Jesus critica os líderes do povo porque estes não administram a obra de Deus como deveriam.

As lideranças, de modo particular, bem como todas as pessoas envolvidas com a obra de Deus, são meros administradores que prestarão conta de seus atos.

A missão desses líderes é produzir boas uvas, ou seja, proporcionar vida plena a todos que estão, de algum modo, sob seus cuidados.

Quando, ao contrário, tais lideranças são geradoras de morte – e morte aqui entendida de diversas formas -, precisam ser afastadas e substituídas.

A turbulenta história de José – rejeitado pelos irmãos – exemplifica o tema da cruz que conduz à vida. Nas tribulações do cotidiano, somos convidados a confiar no Senhor, que é nosso protetor.

Este é o grande pecado. É o pecado de esquecer que Deus se fez Ele mesmo dom para nós, que Deus nos ofereceu isto como dom e, esquecendo isto, tornar-nos proprietários.

Aí, nessa atitude, talvez eu veja no Evangelho o início do clericalismo, que é uma perversão, que renega sempre a eleição gratuita de Deus, a aliança gratuita de Deus, a promessa de Deus.

Esquece a gratuidade da revelação, esquece que Deus se manifestou como dom, se fez dom para nós e nós devemos dá-lo, mostrá-lo aos outros como dom, não como nossa posse.

III.

Atualização

No início do Evangelho segundo São Mateus, a Boa Nova parece ser dirigida unicamente a Israel. O povo escolhido, já na Antiga Aliança, tem a missão de anunciar e de levar a salvação a todas as nações. Mas Israel não foi fiel à sua missão. Jesus, o mediador da Nova Aliança, congregará à sua volta os doze Apóstolos, símbolo do “novo” Israel, chamado a dar frutos de vida eterna e a anunciar a todos os povos a salvação.

Este novo Israel é a Igreja, todos os batizados. Nós temos recebido, na pessoa de Jesus e na Sua mensagem, uma graça única que temos que fazer frutificar. Não podemos conformar–nos com uma vivência individualista e fechada à nossa fé; há que comunicá- la e oferecê-la a cada pessoa que está próxima de nós. Daqui decorre que o primeiro fruto é viver a nossa fé no calor da nossa família, bem como no da comunidade cristã. Tal será simples pois «onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles» (Mt 18,20).


• Mas trata-se de uma comunidade cristã aberta, o que quer dizer que é eminentemente missionária (segundo fruto). Pela força e pela beleza do Ressuscitado “no meio de nós”, a comunidade atrai através todos os seus gestos e atos, e cada um dos seus membros goza da capacidade de envolver homens e mulheres na nova vida do Ressuscitado. E um terceiro fruto consiste em que vivamos na convicção e na certeza de que no Evangelho encontramos a solução para todos os problemas.




quarta-feira, 16 de março de 2022

Homília da Quarta-feira da 2° Semana da Quaresma

I. Introdução

Jesus sabe que Tiago e João estão animados pelo grande entusiasmo por Ele e pela causa do Reino, mas sabe também que as suas expectativas e o seu zelo são contaminados, pelo espírito do mundo.

Como se quisesse dizer: agora, segui-me e aprendei o caminho do amor “em perda”, e o Pai celeste pensará no premio. O caminho do amor está sempre «em perda», pois amar significa pôr de lado o egoísmo, a autorreferencialidade, para servir os outros.

II. Comentário

A lógica do Reino de Deus subverte a lógica do mundo. Entre os seguidores de Jesus, como ele mesmo diz, se espera uma postura diferenciada, pois seus seguidores não são regidos pelas leis do mundo, mas pela lei do amor que reúne irmãos.

Assumir esse caminho requer dos cristãos uma postura consciente e decidida. Não cabem aqui sentimentalismos, mas a certeza de que está sendo percorrido um caminho que, de fato, se decidiu percorrer.

Escolher o serviço, do ponto de vista somente humano, não é aspiração de ninguém; desejamos, sim, privilégios e que sejamos servidos.

Romper com essa forma de pensar significa nadar contra a correnteza e acreditar que as energias empenhadas nessa escolha estão sendo bem empregadas.

No mínimo, seremos vistos como bobos; contudo, neste caso, ser bobo é estabelecer o novo para que o mundo seja melhor.

III. Atualização

• «Oh exuberante amor para com os homens! Cristo foi quem recebeu os cravos nas Suas

imaculadas mãos e pés, sofrendo grandes dores, e a mim, sem sequer experimentar nenhuma dessas dores ou angustia, deu-se-me a salvação pela comunhão das Suas dores» (São Cirilo de Jerusalém)

• «Ao que arrisca o Senhor não o defrauda» (Francisco)

• «Jesus aceitou a profissão de fé de Pedro, que O reconhecia como o Messias, anunciando a paixão próxima do Filho do Homem. Revelou o conteúdo autêntico da sua realeza messiânica, ao mesmo tempo na identidade transcendente do Filho do Homem «que desceu do céu» (Jo 3, 13) e na sua missão redentora como Servo sofredor: «O Filho do Homem [...] não veio para ser servido, veio para servir e dar a vida como resgate pela multidão» (Mt 20, 28). Foi por isso que o verdadeiro sentido da sua realeza só se manifestou do cimo da Cruz» (Catecismo da Igreja Católica, no 440)




terça-feira, 15 de março de 2022

Homília da terça-feira da minha 2 ° Semana da Quaresma

I INTRODUÇÃO

Hoje os escribas e fariseus voltam a ser denunciados por Jesus. Eles se fazem de mestres, mas não são porque despistam às pessoas: «dizem e não fazem».

O que ensinam com palavras o destroçam com sua conduta. Jesus Cristo não quer inimigos, mas não tem mais remédio que falar claro e forte para defender-nos.

São Lucas escreve que Jesus Cristo «começou a fazer e a ensinar». E eu? II. Comentário

Hoje, mais do que nunca, devemos trabalhar pela nossa salvação pessoal e comunitária, como diz São Paulo, com respeito e seriedade, já que «É agora o momento favorável, é agora o dia da salvação» (2Cor 6,2). O tempo quaresmal é uma oportunidade sagrada dada pelo nosso Pai para que, numa atitude de profunda conversão, revitalizemos nossos valores pessoais, reconheçamos nossos erros e nos arrependamos de nossos pecados, de maneira que nossa vida se transforme —pela ação do Espírito Santo— numa vida mais plena e madura.

Para adequar nossa conduta à do Senhor Jesus é fundamental um gesto de humildade, como diz o Papa Bento XVI: «Reconheço-me por aquilo que sou, uma criatura frágil, feita de terra e destinada à terra, mas também feita à imagem de Deus e destinada a Ele».

Na época de Jesus, havia muitos “modelos” que oravam e agiam para serem vistos, para serem reverenciados: pura fantasia, personagens de papelão, que não podiam estimular o crescimento e a madurez dos seus vizinhos. Suas atitudes e condutas não mostravam o caminho que conduz a Deus; «Portanto, tudo o que eles vos disserem, fazei e observai, mas não imiteis suas ações! Pois eles falam e não praticam» (Mt 23,3).

A sociedade atual também nos apresenta uma infinidade de modelos de conduta que abocam a uma existência vertiginosa, aloucada, debilitando o sentido de transcendência. Não deixemos que esses falsos referentes nos façam perder de vista o verdadeiro Mestre: «Um só é vosso Mestre; (...) um só é vosso Pai; (...) um só é o vosso Guia: Cristo» (Mt 23,8.9.10).

Aproveitemos a quaresma para fortalecer nossas convicções como discípulo de Jesus Cristo. Procuremos ter momentos sagrados de “deserto”, onde nos reencontremos com nós mesmos e, com o verdadeiro modelo e mestre. E diante às situações concretas nas que muitas vezes não sabemos como reagir poderíamos nos perguntar: Que diria Jesus? Como agiria Jesus?

III. Atualização

• Hoje, o Mestre adverte-nos contra a hipocrisia e a duplicidade dos escrivas e fariseus. Estes últimos —um grupo religioso contemporâneo de Jesus Cristo— são o “branco” da dita denúncia.

• Numa ocasião Jesus apelidou-os de “sepulcros caiados”. E é o que é próprio da tentação de adotar uma aparência moral: não nos convida diretamente a fazer o mal, isso seria demasiado bruto.


• A tentação finge mostrar-nos o melhor: abandonar, por fim, o ilusório e usar eficazmente as nossas forças para melhorar o mundo. Além de mais apresenta-se com a pretensão do verdadeiro realismo: o real é o que se constata (menosprezando a fé).

• E, de fato, um vício do chamado “farisaísmo” consistia em radicar o bem no cumprimento formal (sem coração) de preceitos, que não eram tanto de Deus mas duma retorcida casuística humana.

• Aí aparece claro o núcleo de toda a tentação: por ordem no nosso mundo somente por nós, sem Deus, contando unicamente com as nossas capacidades.

• Jesus, quero fazer a tua vontade; só me importa o teu juízo.




segunda-feira, 14 de março de 2022

HOMÍLIA DA 2a SEMANA DA QUARESMA

SEGUNDA-FEIRA

I. Introdução

Tende compaixão de mim, ó Deus, e libertai-me! Meus pés estão firmes no caminho reto, nas assembleias bendirei ao Senhor (Sl 25,11s).

De bom grado, Deus acolhe a pessoa que, após reconhecer as próprias falhas, se dispõe a retomar caminhos de vida. Reconheçamos nossa necessidade de conversão e nos abramos ao perdão do Senhor.

II. Comentário

A reconciliação foi um tema fundamental do ministério de Jesus. Tudo quanto fazia visava restaurar os laços de amizade dos seres humanos entre si e com Deus. Ele foi, por excelência, um construtor de reconciliação. Portanto, um bem-aventurado!

No seu ensinamento, o Mestre mostrou a transcendência do perdão que rompe os limites do puro relacionamento humano para levar ao relacionamento das pessoas com Deus. No ato de perdoar, o discípulo do Reino decide seu destino eterno.

A ordem de Jesus – “Perdoai, e sereis perdoados!” – não expressa a reciprocidade do perdão no nível puramente humano, como se ele dissesse: na medida em quem vocês perdoarem o próximo, serão perdoados por ele. Pelo contrário, o perdão oferecido ao próximo tem, como contrapartida, o perdão recebido de Deus. Quem abre o coração e oferece o perdão a seu semelhante, restabelecendo o relacionamento fraterno encontrará no Pai um coração aberto para perdoá-lo e acolhê-lo.

Conclui-se da ordem de Jesus que, quem não perdoa, não receberá o perdão do Pai, pois a falta de comunhão com o semelhante é indício de ruptura com o Pai. Assim, o discípulo do Reino busca construir um relacionamento sólido com o Pai, por meio da comunhão com o seu semelhante. É ilusório querer trilhar um caminho diferente

III.

• • •

• • • •

Atualização

Aquilo que Jesus ensinou a seus discípulos atravessou séculos e é válido para nós ainda hoje.

Jesus é desconcertantemente prático; contudo, engana-se quem considera que assumir na própria vida suas palavras seja fácil.

Jesus pede de seus seguidores, de nós, a conversão do coração e da mente; que rompamos os esquemas que separam e tornam irmãos rivais e nos abramos à fraternidade plena e verdadeira.

Não se trata aqui de um “jogo de conveniência”, mas de novo estilo de vida, em que a palavra de ordem é “amor”.

Na dinâmica proposta por Jesus, não há maiores ou menores; grandes ou pequenos; superiores e inferiores.

Jesus, com suas palavras, seus ensinamentos e sua vida, quer instaurar o Reino de Deus onde todos tenham lugar garantido e sua dignidade assegurada.

Não somos juízes de ninguém; somos irmãos uns dos outros.



domingo, 13 de março de 2022

Homília do II Domingo da Quaresma I

. Introdução

Hoje, o rosto de Jesus muda e a sua veste que se torna cândida e resplandecente, na presença de Moisés e Elias, símbolo da Lei e dos Profetas.

Os três discípulos que assistem ao acontecimento estão oprimidos pelo sono. Só a luta contra o torpor que se apodera deles permite que Pedro, Tiago e João “vejam” a glória de Jesus. Então o ritmo torna-se premente... Pedro fala e, enquanto está a falar, uma nuvem cobre a ele e aos outros discípulos. Os olhos já não podem ver, mas os ouvidos podem ouvir a voz que sai da nuvem: “Este é o Meu Filho dileto, escutai-O”.

Os discípulos já não estão diante de um rosto transfigurado, nem de uma veste cândida, nem de uma nuvem que revela a presença divina. Diante dos seus olhos está “Jesus sozinho”: é quanto é dado aos discípulos e à Igreja em cada época; é quanto deve ser suficiente para o caminho. É ele a única voz que deve ser ouvida.

II. Comentário

Hoje, segundo Domingo da Quaresma, a liturgia da palavra traz-nos invariavelmente o episódio evangélico da Transfiguração do Senhor. Este ano, com os matizes próprios de São Lucas.

O terceiro evangelista é quem mais salienta o Jesus orante, o Filho que está permanentemente unido ao Pai através da oração pessoal, às vezes íntima, escondida, outras vezes na presença dos Seus discípulos, cheia da alegria do Espírito Santo.

Consideremos, então, que Lucas é o único dos sinópticos que começa a narração deste relato assim: «Jesus (...) subiu à montanha para orar» (Lc 9,28), e que, portanto, também é o que especifica que a transfiguração do Mestre se produziu «Enquanto orava» (Lc 9,29). Este não é um fato de importância secundária.

A oração é apresentada como o contexto, natural, para a visão da glória de Cristo: quando Pedro, João e Tiago acordaram, «viram a glória de Jesus» (Lc 9,32). Não só a glória dele, mas também a glória que Deus já manifestara na Lei e nos Profetas; estes —diz o evangelista— «Apareceram revestidos de glória» (Lc 9,31). Efetivamente, também eles encontram o próprio esplendor quando o Filho fala ao Pai no amor do Espírito. Assim, no coração da Trindade, a Páscoa de Jesus, «a saída deste mundo que Jesus iria consumar em Jerusalém» (Lc 9,31) é o sinal que manifesta o desígnio de Deus desde sempre, levado a cabo no seio da história de Israel, até ao seu cumprimento definitivo na plenitude dos tempos, na morte e ressurreição de Jesus, o Filho encarnado.

Convém-nos recordar, nesta Quaresma e sempre, que só deixando aflorar o Espírito de piedade na nossa vida, estabelecendo com o Senhor uma relação familiar, inseparável, poderemos gozar a contemplação da sua glória. É urgente deixarmo-nos impressionar pela visão do rosto do Transfigurado. À nossa vivência cristã, talvez sobrem palavras e falte espanto, aquele que fez de Pedro e dos seus companheiros testemunhas autênticas do Cristo vivo.

III. Atualização

• Hoje, em uma cena espetacular, encontramos Jesus —transfigurado— falando com

Moisés e Elias.


• Sobre o que falam? Da morte do Senhor, para o qual apenas faltavam uns dias.

• Pedro, Santiago e João sofrerão com q prisão do Senhor. Por isso Jesus lhes mostra o

prêmio..., o que é prêmio ao amor.




sábado, 12 de março de 2022

Homília do Sábado 1° semana da Quaresma

I. Introdução

Não há nada de maior e mais fecundo que o amor: ele confere à pessoa toda a sua dignidade, enquanto o ódio e a vingança a desvaloriza, deturpando a beleza da criatura feita à imagem de Deus.

Este mandamento, de responder ao insulto e à ofensa com o amor, gerou no mundo uma nova cultura: “a cultura da misericórdia — devemos aprender e praticar bem esta cultura da misericórdia — que dá vida a uma verdadeira revolução”.

É a revolução do amor, em que os protagonistas são os mártires de todos os tempos. II. Comentário

Jesus reinterpretou, de maneira radical, o mandamento do amor. O Decálogo previa o amor ao próximo e o ódio ao inimigo. Próximo eram os membros da família e as pessoas mais chegadas. Os termos ódio e inimigo não tinham o sentido atual. Odiar era interessar-se pouco por alguém, não lhe dar atenção. Ódio não era sinônimo de raiva, mas apenas isenção de responsabilidade em relação ao outro. Inimigo, por sua vez, era quem estava fora do círculo das relações familiares. Como se vê, o Decálogo estabelecia, com precisão, os limites do amor.

A reinterpretação de Jesus modifica, totalmente, este quadro. O objeto do amor não são exclusivamente os membros da família e as pessoas mais chegadas. Antes, são os inimigos, os que maldizem, odeiam, caluniam os discípulos de Jesus. Este ideal aproxima de Deus o cristão. É próprio do Pai fazer o sol levantar-se para toda a humanidade, sem distinção, bem como fazer chover sobre justos e injustos.

O amor limitado ao círculo das pessoas que amamos não tem nada de novo. A novidade está em seguir a trilha aberta por Jesus.

Suas palavras podem, num primeiro momento, criar resistência. Porém, as exigências do amor não podem levar os cristãos ao esmorecimento.

III. Atualização

• O tempo da Quaresma é preparação imediata para a Páscoa do Senhor. Na Igreja

primitiva, esse tempo era dedicado, de modo particular, à instrução dos catecúmenos,

ou seja, daqueles e daquelas que receberiam o batismo na Vigília Pascal.

• Portanto, a liturgia da Palavra tem esse caráter preparatório ao batismo, pois, com o batismo, o velho homem era sepultado, dando, assim, lugar ao homem novo. E o homem novo, à semelhança do Ressuscitado, é chamado a estabelecer novas

realizações.

• A novidade do Cristo e de seus ensinamentos se mostra nas atitudes novas desses

homens e mulheres que eram reconhecidos como cristãos.

• Amar o inimigo, rezar por quem nos persegue, cumprimentar quem não é do nosso

círculo eram desafios para quem conviveu com Jesus e para nós ainda hoje. E só em Deus somos capazes de dar essa resposta de fé.




sexta-feira, 11 de março de 2022

HOMÍLIA DA SEXTA-FEIRA DA 1a SEMANA DA QUARESMA

I. Introdução

Livrai-me, Senhor, das minhas aflições, vede minha miséria e minha dor; perdoai todos os meus pecados (Sl 24,17s).

Nosso Deus é perdão e não se cansa de chamar os que dele se afastaram. O Senhor ama a vida e quer a felicidade de todos. Manifestemos-lhe, pois, o desejo de conhecer e viver a justiça do seu Reino.

II. COMENTÁRIO

A proposta de Jesus é exigente e direta; essa proposta pede de quem deseja segui-la adesão incondicional.

Jesus quer seus seguidores por inteiro e, de cada seguidor de Jesus, esperam-se comprometimento, mudança de mentalidade e abertura ao novo. Jesus propõe o estabelecimento de novas relações que, em princípio, parecem estranhas, pois ferem ou apresentam um novo modo de ver e ser.

Embora saibamos que armas matam, uma palavra maldita ou o silêncio frio pode ter efeito igualmente mortal na vida do outro. Ao nos encontrarmos em situação de dificuldade com o outro, cabe a nós buscar a reconciliação, mesmo que tenha sido o outro quem errou.

Em relação ao adversário ou inimigo, cabe a nós buscar a paz e a resolução do que nos afasta antes que consequências graves recaiam sobre nós. Sim, eis o tempo de conversão.

III. ATUALIZAÇÃO

• A vida cristã comporta uma forte dose de originalidade. Não que os cristãos sejam

chamados a fazer coisas extravagantes, diferentes do que se exige das demais pessoas. Já os primeiros discípulos de Jesus foram convidados a ter um estilo de vida superior àquele dos fariseus. Que tipo de superioridade é esta?

• Os evangelhos referem-se, de maneira negativa, a uma ala do farisaísmo, em que os indivíduos eram exibidos e exagerados, agindo sempre para serem vistos e louvados por seus concidadãos. Cuidavam da aparência, sem se preocupar com a autenticidade de seu agir. É o que chamamos de hipocrisia!

• O caminho da superioridade cristã consistia na compreensão, cada vez mais exigente, da vontade de Deus expressa no Decálogo. Por exemplo, o mandamento da Lei de Deus ensinava a não matar. Numa visão superficial, bastaria não tirar a vida física do outro para que alguém se considerasse em dia com o mandamento. Jesus, porém, entreviu outras maneiras de matar o próximo.

• A irritação contra alguém e o chamá-lo de imbecil ou louco são formas de desrespeito ao mandamento. Dito de outro modo: o outro não tem vez na minha vida; de certo modo, está morto para mim. A versão cristã do mandamento exige a busca constante de reconciliação. Este é o pré-requisito da relação com Deus.




quinta-feira, 10 de março de 2022

Homília da QUINTA-FEIRA 1° Semana da Quaresma

I. Introdução

Hoje, Jesus anima-nos a pedir, mas a pedir com fé. Não como alguns fariseus que lhe pediam, mas pediam-lhe “milagrezinhos” para comprovar se Ele vinha de Deus. Nem nós necessitamos de provas, nem Deus necessita de demonstrar nada: sabemos que é o nosso Pai do céu e isso nos basta para lhe pedir – com toda a confiança – aquilo de que necessitamos.

«Se vós (...) sabeis dar coisas boas aos vossos filhos, quanto mais o vosso Pai que está nos céus dará coisas boas aos que lhas peçam!»

II. Comentário

Hoje, Jesus nos fala da necessidade e do poder da oração. Não podemos entender a vida cristã sem relação com Deus, nesta relação, a oração ocupa um lugar central. Enquanto vivemos neste mundo, os cristãos nos encontramos num caminho de peregrinação, mas a oração nos aproxima de Deus, nos abre as portas de seu amor imenso e nos antecipa as delicias do céu. Por isso, a vida cristã é uma contínua petição e busca: «Peçam, e lhes será dado! Procurem, e encontrarão! Batam, e abrirão a porta para vocês!» (Mt 7,7),nos diz Jesus.

Ao mesmo tempo, a oração vai transformando o coração de pedra num coração de carne: «Se vocês, que são maus, sabem dar coisas boas a seus filhos, quanto mais o Pai de vocês que está no céu dará coisas boas aos que lhe pedirem» (Mt 7,11). O melhor resumo que podemos pedir a Deus está no Pai Nosso: «venha o teu reino; seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu» (cf. Mt 6,10). Portanto, não podemos pedir na oração qualquer coisa, que não seja realmente um bem. Ninguém deseja um dano para si mesmo; por isso, não podemos querer para os outros.

Há quem se queixa de que Deus no lhe escuta, porque não vê os resultados de imediatamente ou porque pensa que Deus não lhe ama. Nesse caso, não nos fará mal recordar este conselho de São Jerônimo: «É verdade que Deus dá a quem pede, que quem busca encontra, e a quem chama lhe abrem: se vê claramente que aquele que não recebeu que não encontrou, nem lhe abriram, é porque não pediu bem, não buscou bem, nem chamou bem à porta». Peçamos então em primeiro lugar a Deus que faça como que o nosso coração seja bom como o de Jesus Cristo.

III.

Atualização

Hoje consideramos duas expressões da oração. De um lado, a presença de Deus, esse estar interiormente e continuamente com Deus de uma maneira silenciosa, que, por outro lado precisa um sustento: a oração vocal, que se expressa com palavras, imagens e pensamentos.

Esta oração vocal deve brotar, sobretudo, de nosso coração, de nossas dores, esperanças, alegrias, sofrimentos; da vergonha pelo pecado, assim como da gratidão pelo bem, sendo assim uma oração totalmento pessoal. Mas precisamos também do apoio dessas orações nas quais tem tomado forma o encontro com Deus de toda a Igreja (sem esta ajuda, nossa oração pessoal e nossa imagem de Deus se fazem subjetivas e acabam por refletir mais a nós do que ao Deus vivo).


• Nas fórmulas da oração que surgiram primeiro da fé de Israel e depois da fé dos que rezam como membros da Igreja, aprendemos a conhecer a Deus e a nos conhecer nós mesmos: são uma escola de oração




quarta-feira, 9 de março de 2022

HOMÍLIA DA QUARTA-FEIRA DA 1a SEMANA DA QUARESMA

I INTRODUÇÃO

Lembrai-vos de vossa misericórdia e de vosso amor, pois são eternos. Nossos inimigos não triunfem sobre nós; libertai-nos, ó Deus, de toda angústia! (Sl 24,6.3.22)

Sem conhecer a Deus, os ninivitas acolheram sua Palavra e se converteram. Quanto a nós, cristãos, fiquemos alertas para não nos fecharmos à misericórdia divina.

II. COMENTÁRIO

Hoje, Jesus nos diz que o sinal que dará à “geração malvada”, de fato, assim como Jonas foi um sinal para os ninivitas, assim também será o Filho do Homem para esta geração (cf. Lc 11,30). Da mesma maneira que Jonas deixou que o lançasse pela margem para acalmar a tempestade que ameaçava com afundá-los — e, assim, salvar a vida da tripulação—, do mesmo modo que Jesus permitiu que o lançassem pela margem para acalmar as tempestades do pecado que põem em perigo nossas vidas.

E, de igual forma que Jonas passou três dias no ventre da baleia antes que esta o vomitara são e salvo a terra, assim Jesus passaria três dias no seio da terra antes de abandonar a tumba (cf. Mt 12,40).

O sinal que Jesus dará aos “malvados” de cada geração é sua morte e ressurreição. Sua morte, aceita livremente, é o sinal do incrível amor de Deus por nós: Jesus deu sua vida para salvar a nossa. E sua ressurreição de entre os mortos é o sinal de seu divino poder. Trata-se do sinal mais poderoso e comovedor jamais dado.

Mas, Jesus é também a sinal de Jonas em outro sentido. Jonas foi um ícone e um meio de conversação. Quando em sua prédicas «Jonas entrou na cidade e começou a percorrê-la, caminhando um dia inteiro. Ele dizia: «Dentro de quarenta dias, Nínive será destruída!» (Jon 3,4) adverte aos ninivitas pagãos, estes se convertem, pois todos eles — desde o rei até as crianças e animais— se cobrem com serapilheira e cinzas. No dia do julgamento, os homens da cidade de Nínive ficarão de pé contra esta geração.

Porque eles fizeram penitência quando ouviram Jonas pregar. E aqui está quem é maior do que Jonas.” (cf. Lc 11,32) predicando a conversão a todos nós: Ele o próprio Jesus. Portanto, nossa conversão deveria ser igualmente exaustiva.

«Pois Jonas era um servente», escreve São João Crisóstomo na pessoa de Jesus Cristo, «mas eu sou o Mestre; e ele foi jogado pela baleia, mas eu ressuscitei dos mortos; e ele proclamava a destruição, mas vim a predicar a Boas Novas e o Reino».

Na semana passada, na quarta-feira de Cinza, nos cobrimos com cinza, e cada um escutou as palavras da primeira homilia de Jesus cristo, «O tempo já se cumpriu, e o Reino de Deus está próximo. Convertam-se e acreditem na Boa Notícia» (cf. Mc 1,15). A pergunta que devemos fazer-nos é: — Respondido já com uma profunda conversão como a dos ninivitas e abraçado aquele Evangelho?

III. ATUALIZAÇÃO

• Jesus faz um alerta duro contra o povo do seu tempo, que ele chama de “esta geração”. Ele não é reconhecido por ela como o Filho de Deus porque há maldade no coração


desta geração. Gerações passadas foram mais sensíveis aos sinais de Deus e alcançaram

a conversão.

• Jesus é muito maior do que os sinais do passado, mas, curiosamente, “esta geração”

não o reconhece. Poderíamos nos perguntar: como nos relacionamos com Jesus? Quem é Jesus? Com certeza, a maneira como vemos uma pessoa determina a forma como nos relacionamos com ela.

• Jesus, noutra passagem do Evangelho, vai dizer que se relaciona com amigos, pois os amigos sabem quem é e não há segredos que os distanciem. Busquemos, portanto, avaliar como temos nos relacionado com o Mestre e nos acheguemos, sem mais, a ele.



terça-feira, 8 de março de 2022

HOMILIA DA TERÇA-FEIR DA 1a SEMANA DA QUARESMA.

 I. Introdução

Vós fostes, Senhor, o refúgio para nós de geração em geração: desde sempre e para sempre, vós sois Deus (Sl 89,1s).

A Palavra de Deus traz, na sua essência, o poder de fazer o bem. Com toda confiança, acolhamos a comunicação divina, para vivermos o perdão e conformarmos nosso coração à vontade do Pai.

II. Comentário

Rezar pode ser muito simples e, ao mesmo tempo, muito complexo; algo fácil e, por vezes, difícil. Mais uma vez, Jesus é prático em suas orientações e adverte que não é necessário ficar repetindo palavras quando se reza, pois isso pode ser inútil.

Deus conhece nossas necessidades desde sempre. A oração proposta por Jesus reconhece Deus como Pai e não um pai “meu”, mas “nosso”. Somos irmãos, estamos juntos nesse caminho que nos conduz ao Reino.

Essa oração também fala do pão cotidiano, necessidade básica; do perdão que somos chamados a dar e pedir; e, por fim, roga-se pela proteção contra todo mal.

Temos uma oração sintética e profunda que se torna modelo de oração para todos nós e em todos os tempos. Para que sejamos cristãos autênticos, a relação conosco, com Deus e com os irmãos precisa ser sempre cuidada.

III. Atualização

• «Que oração mais espiritual pode haver que a que nos foi dada por Cristo, por quem

nos foi também enviado o Espírito Santo? Que oração mais verdadeira ante o Pai que a que brotou dos lábios do Filho?» (São Cipriano)

• «O “Pai Nosso” inicia com um grande consolo: podemos dizer “Pai”, porque o Filho é nosso irmão e nos revelou ao Pai; porque graças a Cristo temos volto a ser filhos de Deus» (Bento XVI)

• «Nós podemos invocar Deus como “Pai”, porque Ele nos foi revelado pelo seu Filho feito homem e porque o seu Espírito no-Lo faz conhecer. A relação pessoal do Filho com o Pai, que o homem não pode conceber nem os poderes angélicos podem entrever, eis que o Espírito do Filho nos faz participar dela, a nós que cremos que Jesus é o Cristo e que nascemos de Deus» (Catecismo da Igreja Católica, n° 2780)




segunda-feira, 7 de março de 2022

Homília da segunda-feira da 1° semana da Quaresma

I. Introdução

O percurso quaresmal pede de nós uma profunda revisão de vida que não deveria ser teórica, mas prática. Isso significa que somos convidados a passar das boas intenções para atitudes concretas, ou seja, quando e como, segundo as nossas possibilidades, estamos acolhendo o irmão que passa por necessidade, a começar por aqueles que estão mais perto de nós? A instrução é muito importante e necessária para todo ser humano, mas devem-se associar à instrução formal gestos concretos de promoção da vida.

A vivência da nossa fé pode, sim, ser expressa por meio de palavras que não deveriam ser sinal de autopromoção, mas meio de edificação da comunidade por causa daquilo que realizamos. A nossa forma de viver e as escolhas que fazemos já nos dizem se estamos distantes ou próximos de Deus e de seu projeto de vida.

II. Comentário

Hoje, diante a imagem do Juízo final, a Quaresma nos renova a esperança Naquele que nos faz passar da morte à vida. O juízo é um “lugar de exercício da esperança”. A imagem do Juízo final não é uma imagem horripilante, senão uma imagem decisiva de esperança: Unicamente Deus pode criar justiça.

Deus revelou seu rosto precisamente na figura daquele que sofre e compartilha a condição do “homem abandonado” levando-a consigo Este Inocente que sofre converteu-se em esperança-certeza: Deus existe, e Deus sabe criar a justiça de um modo que nós não somos capazes de conceber e que, porém, podemos intuir na fé. Sim, existe a ressurreição da carne; existe uma justiça! Existe a “revogação” do sofrimento passado, a reparação que restabelece o Direito.

A fé no Juízo final é, acima de tudo, esperança, cuja necessidade se fez evidente precisamente nas convulsões dos últimos séculos: a injustiça da história não terá a última palavra.

III.

• •

Atualização

Hoje, escutamos o relato do “juízo final”. Bom tema para a Quaresma! Juízo? No fim? Sim!, no fim da vida cada um verá como aproveitou (ou desaproveitou) a sua própria vida.

É inevitável! Não somos nem robots nem animaizinhos sem consciência: somos seres livres; livres para amar.

Como é que se ama? Jesus Cristo concretizou-o nas obras de misericórdia: «Tive fome, e deste-me de comer; tive sede...». Deus sente (ou sofre) o nosso amor (ou desamor) com os irmãos.



domingo, 6 de março de 2022

Homília do 1° Domingo da Quaresma

I. Introdução

Hoje Jesus, «cheio do Espírito Santo» (Lc 4,1), introduz-se no deserto, longe dos homens, para experimentar de forma imediata e sensível a sua dependência absoluta do Pai.

II. Comentário

Jesus sente-se agredido pela fome e esse momento de desfalecimento é aproveitado pelo Maligno, que lhe tenta com a intenção de destruir o núcleo da identidade de Jesus como Filho de Deus: sua adesão substancial e incondicional ao Pai.

Com os olhos postos em Cristo, vencedor do mal, hoje os cristãos nos sentimos estimulados a entrar no caminho da Quaresma. Nos leva a isso o desejo de autenticidade: ser plenamente aquilo que somos: discípulos de Jesus e, com Ele, filhos de Deus. Por isso queremos aprofundar na nossa adesão a Jesus Cristo e ao seu programa de vida que é o Evangelho: «nem só de pão viverá o homem» (Lc 4,4).

Como Jesus no deserto, armados com a sabedoria da Escritura, sentimo-nos chamados a proclamar no nosso mundo consumista que o homem está desenhado a escala divina e que só pode saciar sua fome de felicidade quando abre de par em par as portas da sua vida a Jesus Cristo Redentor do homem. Isso comporta vencer multidão de tentações que querem diminuir nossa vocação humano-divino. Com o exemplo e com a força de Jesus tentado no deserto, desmascaremos as muitas mentiras sobre o homem que se dizem sistematicamente desde os meios de comunicação social e desde o meio ambiente pagão onde vivemos.

São Bento dedica o capítulo 49 da sua Regra a “Da observância da quaresma” e exorta a “apagarem nestes dias santos as negligências dos outros tempos (...), dando-nos à oração com lágrimas, à leitura, à compunção do coração e à abstinência (...),a oferecer cada um alguma coisa a Deus, de espontânea vontade, com a alegria do Espírito Santo(...) e a esperar com desejo espiritual a Santa Páscoa».

III. Atualização

• «Se nele fomos tentados, também nele venceremos o diabo. Você percebe que Cristo

foi tentado, e não que ele venceu? Reconheça-se tentado nele, e reconheça-se como vencedor nele também» (Santo Agostinho)

• «Quando estamos em tentação, a Palavra de Jesus nos salva. Ele é grande porque não só nos faz sair da tentação, mas também nos dá mais confiança» (Francisco).

• «A tentação de Jesus mostra como ser o Filho de Deus o Messias; em oposição ao proposto por Satanás e ao que os homens querem atribuir. É por isso que Cristo venceu o Tentador a nosso favor: “Porque não temos sumo sacerdote que não se compadeça das nossas fraquezas, mas que seja provado em tudo como nós, exceto no pecado” (Hb 4,15). A Igreja une-se todos os anos, durante os quarenta dias da Quaresma, ao Mistério de Jesus no deserto» (Catecismo da Igreja Católica, n. 54



sábado, 5 de março de 2022

Homília do Sábado depois das Cinzas.

I. Introdução

Chamando Mateus, Jesus mostra aos pecadores que não tem em consideração o passado deles, nem a sua condição social, nem sequer as convenções exteriores mas, ao contrário, abre-lhes um novo futuro. Certa vez ouvi um bonito ditado: «Não há santo sem passado, nem pecador sem futuro».

É isto que Jesus faz. Não há santo sem passado, nem pecador sem futuro. É suficiente responder ao convite com o coração humilde e sincero.

A Igreja não é uma comunidade de pessoas perfeitas, mas de discípulos a caminho, que seguem o Senhor porque se reconhecem pecadores e necessitados do seu perdão.

Por conseguinte, a vida cristã é escola de humildade que nos abre à graça. II. Comentário

Hoje vemos como avança a Quaresma e a intensidade da conversão a que o Senhor nos chama. A figura do apóstolo e evangelista Mateus é muito representativa daqueles que podemos chegar a pensar que por causa do nosso historial, ou pelos pecados pessoais ou por situações complicadas, é difícil que o Senhor repare em nós para colaborarmos com Ele.

Pois bem, Jesus Cristo, para nos tirar de toda a dúvida põe-nos como primeiro evangelista um cobrador de impostos Levi, a quem diz sem rodeios: «Segue-me» (Lc 5,27). Fez, com ele exatamente o contrario daquilo que a mentalidade “prudente” poderia esperar. Hoje procuramos ser “politicamente corretos”, Levi —pelo contrário— vinha de um mundo que tinha repulsa pelos seus compatriotas, pois consideravam-no, apenas por ele ser publicano, colaboracionista dos romanos e possivelmente fraudulento com as “comissões”, o que afogava os pobres ao cobrar-lhes os impostos, em fim, um pecador público.

Aos que se consideravam perfeitos não se lhes passava pela cabeça que Jesus não apenas os chamaria a segui-lo, nem muito menos apenas a sentarem-se à mesma mesa.

Mas com esta atitude, ao escolhe-lo, Nosso Senhor Jesus Cristo diz-nos que é mais deste tipo de gente de quem gosta de se servir para estender o seu Reino; escolheu os malvados, os pecadores, e os que não se consideram justos: «Para confundir os fortes, escolheu os que são débeis aos olhos do mundo» (1Cor 1,27). São estes os que necessitam de médico, e sobretudo, são eles os que compreenderão que os outros o necessitam.

Devemos pois evitar pensar que Deus quer expedientes limpos e imaculados para O servir. Este expediente apenas o preparou para a Nossa Mãe. Mas para nós, sujeitos da salvação de Deus e protagonistas da Quaresma, Deus quer um coração contrito e humilhado. Precisamente, «Deus escolheu-te débil para te dar o seu próprio poder» (Sto. Agostinho). Este é o tipo de gente que, como diz o salmista, Deus não menospreza.

III. Atualização

• As palavras e o agir de Jesus são marcados por aparente simplicidade e, ao mesmo

tempo, por grande profundidade. Ao responder que são os doentes que precisam de médico, Jesus está afirmando o óbvio; contudo, muitas vezes o óbvio não é percebido e, por isso mesmo, não desperta nossa sensibilidade nem provoca em nós algum tipo de atitude.


• Infelizmente, o olhar do ser humano se acostuma a ver realidades duras e pesadas, feias e injustas, e as considera como algo “normal”, parte do cenário ou da paisagem. A sensibilidade do olhar de Jesus é bem diferente, pois leva ao acolhimento dos excluídos, e possibilita que eles retomem sua dignidade. Jesus “viu” Levi e o chamou para segui-lo.

• Jesus sabia que Levi era um pecador público, mas essa condição não o desqualificava como ser humano, desde que tivesse o desejo de mudar e converter-se.