I. INTRODUÇÃO
A festa do Corpo de Cristo tem uma longa história. No final do século XIII em Liège, na Bélgica, havia um grande movimento eucarístico. S. Juliana teve a inspiração de fazer uma festa para o Santíssimo Sacramento. O Papa Urbano IV, quando era padre, era seu orientador. Ele instituiu a festa para toda a Igreja.
Não podemos dizer que perdemos o fervor antigo, só porque não fazemos como antigamente. Atualmente, estamos mais voltados para a Eucaristia como um todo, no qual o Sacrifício e o Sacramento estão unidos. O Santíssimo Sacramento não é um santo a mais.
Por outro lado, perdeu-se muito do sentido da presença de Jesus na Eucaristia. Há muito a se recuperar. Se Ele está ali sob as espécies de pão e vinho, deve ser reconhecido e adorado. É o mesmo Cristo que recebemos na Eucaristia e trazemos em nós depois da comunhão. Somos sacrários vivos da Eucaristia. Estamos, assim, unidos à Páscoa de Jesus.
II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
1. I leitura (Ex 24,3-8)
No Sinai, Deus apareceu para concluir a aliança com seu povo: Ele oferece aliança, o povo se dispõe a observar suas instituições. Antes da leitura do documento da Aliança, Moisés asperge, com o sangue da Aliança, o altar, sinal da presença divina; depois da leitura, asperge o povo.
Esse gesto significa a comunhão do povo escolhido com o Senhor. O povo escolhido se compromete com palavras a manter a Aliança: “Faremos tudo quanto nos disse o Senhor” (v. 7).
Assim, essa aliança, celebrada com sangue de animais, selava o compromisso de obediência por parte de Israel, que reconhecia todos os benefícios recebidos no deserto, rumo à Terra Prometida.
No sacrifício da Aliança, somente animais podem ser vítimas, porque a intervenção poderosa do Deus da Aliança retirou Israel de uma situação de morte para levá-lo a uma vida digna, de proximidade com ele.
2. II leitura (Hb 9,11-15)
A mensagem dessa carta apostólica é que o culto da Antiga Aliança foi substituído pelo sacrifício de Jesus e, portanto, os cristãos não devem abandonar a vida cristã.
Assim como o sumo sacerdote, no Antigo Testamento, tinha direito de acesso ao Santo dos Santos por carregar o sangue dos animais, a vida de Jesus, oferecida em sacrifício, dá-lhe o direito de acesso ao santuário celestial.
A ênfase está no sacerdócio eterno de Jesus, em contraposição ao sacerdócio transitório do AT; ressalta-se a eternidade do sacrifício único de Jesus, em contraposição aos sacrifícios de animais repetidos pelos sacerdotes no dia da expiação. Jesus, como vítima sem mancha, redimiu toda a humanidade por sua oferta na cruz. Para os cristãos, ele é o sacrifício e o sacerdote ao mesmo tempo.
3. Evangelho (Mc 14,12-16.22-26)
Hoje, é o sacerdote ordenado que pronuncia as palavras de Jesus, mas não é ele que lhes dá sentido e realidade. É sempre Jesus ressuscitado que se compromete, exatamente como na noite de quinta-feira santa. O sacerdote e toda a comunidade com ele são convidados a aderir na fé a esta ação de Jesus. Mas não têm o poder de retirar a eficácia das palavras que não lhes pertencem. A Igreja tem razão em celebrar esta permanência da presença de Jesus. Que esta seja para nós fonte de maravilhamento e de ação de graças!
O sentido dessa refeição está nas próprias palavras de Cristo: seu corpo e seu sangue doados por todos como sacrifício da Nova e Eterna Aliança. Na perspectiva teológica do evangelista Marcos, Jesus celebra a última ceia pascal no primeiro dia dos Pães Ázimos, quando se imolava o cordeiro. O relato põe em evidência que é o próprio Jesus quem orienta os discípulos e prepara sua páscoa, na qual se realiza a plena libertação, a Nova Aliança no seu sangue.
Uma interpretação unilateral do Concílio Vaticano II tinha penalizado esta dimensão, limitando praticamente a Eucaristia ao momento celebrativo. Com efeito, foi muito importante reconhecer a centralidade da celebração, no qual o Senhor convoca o seu povo, o reúne ao redor da dúplice mesa da Palavra e do Pão de vida, o alimenta e o une a Si no ofertório do Sacrifício. Esta valorização da assembleia litúrgica, em que o Senhor age e realiza o seu mistério de comunhão, permanece obviamente válida, mas ela deve ser recolocada no equilíbrio justo. Com efeito - como acontece com frequência - para ressaltar um aspeto termina-se por sacrificar outro.
O gesto levado a cabo por Jesus na Última Ceia é a extrema ação de graças ao Pai pelo seu amor, pela sua misericórdia. Em grego, «ação de graças» diz-se «eucaristia». É por isso que o Sacramento se chama Eucaristia: é a suprema ação de graças ao Pai, o qual nos amou a tal ponto que nos ofereceu o seu Filho por amor. Eis por que motivo o termo Eucaristia resume todo aquele gesto, que é de Deus e ao mesmo tempo do homem, gesto de Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem.Celebrar a festa de Corpus Christi é reconhecer sua presença na Eucaristia e mostrar exteriormente que cremos em sua presença.
III. ATUALIZAÇÃO
• Hoje, celebramos solenemente a presença eucarística de Cristo entre nós, o “dom por excelência”: “Durante a refeição, Jesus tomou o pão e, depois de o benzer, partiu-o e deu-lho, dizendo: Tomai, isto é o meu corpo. “(Mc 14,22.24). Disponhamo-nos a suscitar na nossa alma o “assombro eucarístico” (S. João Paulo II).
• O povo judeu na sua ceia pascal comemorava a história da salvação, as maravilhas de Deus para com o seu povo, especialmente a libertação da escravidão do Egito. Nesta comemoração, cada família comia o cordeiro pascal. Jesus Cristo converte-se no novo e definitivo cordeiro pascal sacrificado na cruz e comido em Pão Eucarístico.
• A Eucaristia é sacrifício: é o sacrifício do corpo imolado de Cristo e do seu sangue derramado por todos nós, antecipado na Última Ceia. Ao longo da história irá sendo atualizado em cada Eucaristia. Nela temos o alimento: é o novo alimento que dá vida e força ao cristão enquanto caminha em direção ao Pai.
• A Eucaristia é presença de Cristo entre nós. Cristo ressuscitado e glorioso permanece entre nós de maneira misteriosa, mas real na Eucaristia. Esta presença provoca uma atitude de adoração por nossa parte e uma atitude de comunhão pessoal com Ele. A presença eucarística garante-nos que Ele permanece entre nós e opera a obra da salvação.
• A Eucaristia é mistério de fé. É o centro e a chave da vida da Igreja. É a fonte e raiz da existência cristã. Sem vivência eucarística a fé cristã ficaria reduzida a uma filosofia.
• Jesus dá-nos o mandamento do amor de caridade na instituição da Eucaristia. Não se trata da última recomendação do amigo que parte para longe ou do pai que vê a morte aproximar-se. É a afirmação do dinamismo que Ele nos oferece. Pelo Baptismo começamos uma vida nova, que é alimentada pela Eucaristia. O dinamismo desta vida leva a amar os outros, e é um dinamismo em crescimento até dar a vida: nisto se verá que somos cristãos.
Cristo ama-nos porque recebe a vida do Pai. Nós amaremos recebendo do Pai a vida, especialmente através do alimento eucarístico.